domingo, 19 de maio de 2013

Hóspede do tempo

Há tantos poemas, canções e filosofias sobre o tempo que escrever sobre nossa relação com ele parece redundante. Mas tenho refletido muito sobre o tempo. No quanto ele nos ultrapassa. No quanto eu me pego dizendo: "Queria ter mais tempo para escrever (ou qualquer outra atividade que me seja muito prazerosa)". E quantas vezes, neste tumultuado ano de 2013, eu ouvi pessoas falando sobre como o tempo está passando incrivelmente rápido - como se fosse ele, e não nós, que tivesse pressa...
A verdade é que brincamos com o tempo. Fazemos planos como se ele nos pertencesse. Adiamos coisas essenciais para a nossa felicidade, pensando que, em um "depois" - projeção de um futuro vago e indefinido - teremos tempo para dar atenção a nós mesmos e a quem amamos, para aprender algo que nos encanta, para dançar, cantar, descansar, em suma, procurar a alegria e a paz.
Adiamos sempre, crendo que nós temos o controle e resolveremos tudo. "Mas eis que chega a roda viva e carrega o destino pra lá", como diz a maravilhosa canção de Chico Buarque.
Em menos de 7 dias vivi duas experiências opostas. Fui da extrema satisfação à extrema angústia. Em um domingo, eu estava cercada de pessoas queridas, numa linda manhã de maio, realizando algo há muito sonhado, conquistado com muito trabalho: a publicação do meu primeiro livro de ficção. No sábado seguinte, tudo voou pelos ares: um automóvel preto cortou a pista, capotou, caiu na ribanceira. Neste carro, as pessoas que mais amo na vida. Não só as rodas, mas de repente, o mundo de ponta-cabeça.
E então era como se o tempo tivesse parado. Tudo ficou em suspenso, na espera angustiosa do que aconteceria. Depois que a morte passou por nós e se foi sem levar ninguém, ficaram as dúvidas dos danos do acidente. Todos os planos perderam o sentido perto do que tem realmente importância: conseguir respirar, comer, andar...
É impressionante como precisamos que a vida nos chacoalhe violentamente para percebermos o que é essencial. Tenho aprendido muito nestes dias com minha mãe. Com sua imensa paciência diante da dor e da dependência de terceiros para fazer qualquer coisa. Com seu sorriso amável de agradecimento à vida por mais esta oportunidade de continuar no tempo. De se hospedar nesse mundo. Porque é isso que somos: hóspedes. Nada nos pertence: nossas casas, carros, celulares, nem sequer esse corpo que chamamos de nosso nos percente. E na nossa imensa arrogância, agimos como se tudo nos pertencesse, inclusive o tempo e a própria vida.
Eu agradeço ao tempo, um dos deuses mais lindos, como diz Caetano, por continuar sendo sua hóspede. E termino este post com a bela canção de Zélia Duncan. Porque o que vale é nossa atitude, a cada dia, que pode ou não ser o último.