sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Da incapacidade de não escrever

Ontem estava uma tarde cinza e fui tomar um café com poemas com meu amigo Pedro Marques. Nada mais apropriado a uma tarde em que o tempo parecia estar mais lento. Eu me sentei ao lado das janelas amplas do café e lá fora, o movimento dos carros era incessante, mas as árvores estavam estáticas. O ar parado, os troncos das árvores elevados em alerta, mas sem acenos para mim. Deixei-me ficar simplesmente, queria ficar estática como as árvores, em profundo estado de inércia, mas a poesia veio:

Na janela o refúgio
temor de paredes esmagadoras
procuro a moldura luminosa
braços de árvores
não me acenam
verdes dedos
imaturidade ou esperança
apontam o céu cinza
espectadores da rua
dos passos dos garotos
da corrida dos carros
do sono dos cães.

Depois veio o poeta e a conversa sempre boa sobre literatura, versos e toda a vida neles contida... Em um momento, eu disse "Continuo a escrever pela incapacidade de não fazê-lo". Recentemente, um amigo, Pandiá Mendes, me perguntou como/quando escolhi ser uma escritora. Acho que ao invés de escolher, eu não fui capaz de não ser... Confuso, assim...
E já que este post está pingando confessionalismo (tende paciência comigo, pobres e seletos leitores!), vou colocar mais do meu credo pessoal da poesia. Pedro me disse ontem que a poesia para ele não deve reforçar o mundo como ele é, nem as coisas como são comumente vistas, mas o contrário disso. Então fiquei ontem ruminando como eu penso e vivencio a poesia e cheguei a estas ideias:

1. Poesia não se conforma em ser só texto impresso: quer ganhar a boca, os ares, ser lida e cantada em alto e bom som.
2. Versos foram feitos pra dançar: poesia tem corpo, substância; relaciona-se com o tempo como todos os bailados.
3. Poesia não dorme. Não está no limbo esperando, está no movimento, na vida. A gente é que, às vezes, não consegue ver nem ouvir porque não presta atenção.

São 3, mas estão longe da perfeição cósmica, podem e devem mudar muitas vezes, nesse fervilhar constante que sou/estou...